Seletividade Alimentar no Autismo

A alimentação em crianças é causa de aflição em muitos pais, que procuram levar aos seus filhos, uma alimentação balanceada e nutritiva. No entanto, sabemos que crianças tendem a ser seletivas com alguns tipos de alimentos. Falando em autismo, essa preocupação aumenta, pois a recusa pode ser ainda maior nesses casos.

Em uma pesquisa, onde pais de crianças com TEA foram entrevistadas, 67% relataram que seus filhos tinham seletividade alimentar, sendo a textura dos alimentos (69%) o fator de maior relevância nessa seletividade, seguido da aparência (58%), sabor (45%), cheiro (36%) e temperatura (22%). Mas, o maior problema identificado pelos pais, relativos a comportamentos alimentares e orais, foi a relutância em experimentar novos alimentos (69%) (Cermak, Curtin, Bandini, 2010).

Outros fatores podem estar associados como, atrasos das habilidades motoras orais resultando em aumento de esforço para mastigação; os padrões de comportamento restritos, repetitivos ou estereotipados, que levam a uma insistência na mesmice e recusa a flexibilidade; e ainda problemas gastrointestinais, que podem relacionar desconforto à alimentação ou intolerância ou alergia, que também podem interferir.

Segundo a nutricionista Isabella Oliveira – que hoje atende em grande parte pacientes autistas – “crianças com TEA possuem uma maior pré-disposição à seletividade, isso porque a seletividade é multifatorial; embora nem todas as crianças com TEA a tenham, o trabalho com elas é sempre voltado a manter uma boa variedade alimentar”.

De acordo com ela, pais/ cuidadores podem ajudar nessa questão, na rotina da criança. O primeiro passo é ter em mente que adultos entendem que a alimentação é um determinante de saúde, mas as crianças ainda não. “Na realidade delas, não entendem o motivo pelo qual precisa-se comer, por isso, uma das principais ferramentas usadas é uso do lúdico trazendo a criança a um momento prazeroso”, explica Isabella.

Uma forma de fazer isso é associar os alimentos a momentos que a criança já se sente confortável. Por exemplo: se seu filho(a) gosta muito de assistir vídeos, você pode apresentar vídeos onde fale sobre alimentação, com músicas que incentivem a criança à comer. Ou se a criança gosta de atividades de pintura, pode-se fazer um carimbo usando legumes ou até mesmo tinta caseira feita com condimentos naturais.

“Nunca devemos de imediato colocar um novo alimento e exigir que a criança coma, sem antes apresentá-lo e deixar que ela se familiarize. Dessa forma, incluímos os alimentos em outros momentos, retirando a pressão que muitas vezes acontecem no momento das grandes refeições, como o almoço e jantar, por exemplo – explica a nutricionista.

A seletividade alimentar pode causar, a longo prazo, déficit no crescimento, ineficiências nutricionais, anemia, atrofia da musculatura, diabetes, hipertensão arterial e doenças crônicas não-transmissíveis de forma geral.

Por isso é tão necessário a criança ter uma variedade alimentar. E isso já deve ser iniciado na introdução alimentar, que é o momento oportuno para a criação de bons hábitos alimentares. Nessa fase, é importante que a criança possa tocar e sentir as diferentes texturas que os alimentos possuem, respeitando os sinais de fome e saciedade, além de ser ideal que os alimentos sejam oferecidos de forma individual, nunca misturados.

Outro ponto muito importante, que a nutricionista aponta, é que “a comida nunca deve ser liquidificada e/ou peneirada, assim mantemos as fibras e possibilitamos o exercício da musculatura oral dessa criança, favorecendo um melhor desenvolvimento deles”.

Terapia Alimentar em crianças com TEA e o termo FOOD CHAINING

A Terapia Alimentar baseia-se em técnicas de dessensibilização visando ressignificar e aproximar a criança dos alimentos, oferecendo estímulos sensoriais e avançando na escada do comer.

De acordo com Isabella, o termo “FOOD CHAINING” refere-se a uma técnica criada para introduzir novos alimentos a crianças que enfrentam dificuldades na escalada do comer através de uma “cadeia alimentar de segurança”.

“Ela parte da ideia de introduzir novos alimentos através das experiências anteriores prazerosas e de sucesso da criança. Nesse processo, a apresentação do novo alimento deve ser semelhante em sabor, textura, temperatura, forma ou cor dos alimentos que a criança já gosta ou aceita.”

Para garantir uma alimentação segura, frente a dificuldades alimentares, é necessário utilizar técnicas que melhorem e facilitem o dia a dia, inserindo pequenas mudanças que serão possíveis e palpáveis, como incluir um alimento rico nutricionalmente em preparações que a criança rotineiramente aceita e garantindo o desenvolvimento e crescimento saudável através de suplementos necessários.

Mesmo com todas as dificuldades, a seletividade alimentar pode ser gradativamente superada, através de tratamentos com profissionais especializados, como terapeuta ocupacional (integração sensorial), fonoaudióloga(o), nutricionista e psicóloga(o). Além disso, o estímulo da família em casa é fundamental.

REFERÊNCIAS:

https://seattlemamadoc.seattlechildrens.org/why-children-with-autism-struggle-with-eating/

https://www.ncbi.nlm.nihgov/pmc/articles/PMC3601920