Pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) passam a ter direito à terapia alimentar no Sistema Único de Saúde (SUS), conforme determina a Lei nº 15.131/2025, sancionada recentemente pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. A medida, publicada no Diário Oficial da União em 30 de abril, altera a Lei nº 12.764/2012, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com TEA, e representa um avanço importante no cuidado integral dessa população.
A nova norma estabelece diretrizes específicas para a terapia nutricional de pessoas com TEA, incluindo ações de cuidado, promoção e proteção da saúde sob o ponto de vista alimentar. O acompanhamento deve ser realizado por profissionais de saúde legalmente habilitados, seguindo protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas definidas pelas autoridades competentes.
Entenda a seletividade alimentar no autismo
De acordo com estudos científicos, entre 40% e 80% das pessoas autistas apresentam algum grau de seletividade alimentar — condição caracterizada por uma dieta extremamente restrita, baseada em uma quantidade muito limitada de alimentos. Essa seletividade está relacionada, muitas vezes, à hipersensibilidade sensorial comum no autismo.
Pessoas com TEA podem apresentar reações intensas a determinados cheiros, cores, sabores, temperaturas e, principalmente, texturas dos alimentos. É comum, por exemplo, a recusa de alimentos pastosos ou crocantes, ou o consumo exclusivo de itens de uma única cor. Essa condição vai além de uma simples “preferência alimentar” e pode impactar diretamente a qualidade nutricional da dieta, causando deficiências importantes.
A má alimentação decorrente da seletividade pode levar a problemas como obesidade, desnutrição, anemia, falta de vitaminas e minerais essenciais, além de prejudicar o desenvolvimento cognitivo, motor e imunológico.
Importância da terapia nutricional
A nova legislação é fruto do Projeto de Lei 4.262/2020, apresentado pela ex-deputada Aline Gurgel (AP), com o objetivo de enfrentar esses desafios alimentares e garantir às pessoas com TEA avaliações e intervenções nutricionais adequadas.
Durante a tramitação no Senado, o texto recebeu parecer favorável da Comissão de Assuntos Sociais (CAS), com relatoria do senador Flávio Arns (PSB-PR). Arns destacou que a má alimentação pode ter consequências graves e que a medida vem ao encontro da necessidade de ampliar o cuidado com a saúde global da população autista.
Já o senador Paulo Paim (PT-RS), ao apresentar o relatório no Plenário, enfatizou que o projeto assegura aos profissionais de saúde a realização de avaliações criteriosas dos riscos nutricionais — incluindo alergias, intolerâncias alimentares e aversões sensoriais. Ele também chamou atenção para o ônus financeiro que esses tratamentos impõem às famílias, especialmente diante de hábitos alimentares inadequados, sedentarismo e uso contínuo de medicações que podem favorecer o ganho de peso.
Um marco para a inclusão e qualidade de vida
A votação no Senado aconteceu no dia 2 de abril, data que marca o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo. Na ocasião, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, comemorou a aprovação da proposta, destacando a relevância da medida para a inclusão:
“Muitas coisas que aparentemente possam parecer pequenas são grandiosas na vida dessas pessoas quando a gente coloca na legislação brasileira uma lei que possa protegê-las. Hoje é um sinal claro de que estamos cuidando de quem precisa ser cuidado”, declarou.
A senadora e médica Dra. Eudócia (PL-AL) também reforçou a importância da nova lei. Para ela, o diagnóstico precoce, o acesso a terapias adequadas e a informação correta são pilares fundamentais para um atendimento eficaz e humanizado.
“A empatia e a informação são ferramentas poderosas para desmistificar preconceitos e construir um futuro no qual todas as pessoas sejam valorizadas por quem realmente são”, afirmou.
Acesso gratuito e especializado
Com a sanção da Lei nº 15.131/2025, o SUS passa a oferecer atendimento nutricional especializado para pessoas com TEA, ampliando as possibilidades de cuidado e promovendo saúde, bem-estar e autonomia alimentar.
A expectativa é que a medida beneficie diretamente uma parcela significativa da população. O Brasil tem hoje cerca de 2 milhões de pessoas diagnosticadas com autismo, e mais da metade apresenta algum grau de seletividade alimentar.
Além de garantir o direito ao cuidado, a nova legislação representa um passo importante para reconhecer o autismo em todas as suas dimensões, incluindo aquelas menos visíveis, como a dificuldade de comer.